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A Corrupção,essa desconhecida: para bem combatê-la, a sociedade precisa saber mais sobre ela

24 de julho de 2012 - 08:06

Há mais de meio século, existe entre nós uma falcatrua intelectual muito ao gosto da esquerda: a de acusar de “moralismo”, “udenismo”, lacerdismo” etc todo aquele que tenta denunciar atos de corrupção. Por incrível que pareça, essa prática não foi para o lixo, como deveria, nem depois que a Constituição de 88 fortaleceu o sistema de combate à corrupção (pelo artigo 37, por exemplo, e evidentemente pela autonomia e pela função mais ampla que concedeu ao Ministério Público).

No momento, eu não disponho de uma lista confiável de fontes brasileiras sobre o assunto. Penso em divulgá-la mais adiante, quando estiver mais completa. Hoje eu gostaria de dizer algumas palavras sobre estudos feitos em outros países; oxalá as editoras brasileiras se interessem por esse filão, que tende a crescer rapidamente.

Em francês, há um livro notável: PROFESSION CORRUPTEUR , de Roger Lenglet (edição de 2007 da editora Jean-Claude Gawsewitch, Paris).

O autor, um jornalista, pesquisou longamente o tema. Seu livro baseia-se em entrevistas com “corruptores” que atuam junto ao governo e à administração pública da França. Um must.

Outro que eu recomendo enfaticamente é CORRUPT EXCHANGES – ACTORS, RESOURCES, AND MECHANISMS OF POLITICAL CORRUPTION, dos cientistas políticos Donatella della Porta e Alberto Vannucci, publicado em 1999 pela editora Aldine de Gruyter, de Nova York.

O estudo de [della] Porta e Vannucci baseia-se nos autos da operação que se tornou mundialmente famosa com o nome de “mani puliti” (mãos limpas). Faço a seguir uma breve apresentação do livro; os trechos entre aspas são trechos traduzidos por mim.

Na Itália, em 1992, quando começaram as denúncias de corrupção que deflagrariam a operação “mãos limpas”, o partido mais atingido foi o Socialista do ex-premier Bettino Craxi. Percebendo que a barra estava ficando pesada para o lado dele, Craxi decidiu falar sobre o assunto no Senado. O teor do que ele disse não nos é de todo estranho, como veremos a seguir; o desfecho, sim.

No dia 3 de julho, dirigindo-se a seus colegas senadores, Craxi tratou de minimizar as acusações. Tentou se defender numa linha que poderíamos chamar de tomista: aquela do “todo mundo sabe”. E apelando para uma espécie de chantagem: a democracia é assim, se quiserem acabar com tais práticas, terão de acabar com a democracia.

“Os partidos políticos – afirmou – têm sido o corpo e a alma de nossas estruturas democráticas. Infelizmente, às vezes é difícil identificar, prevenir e remover áreas de infecção na vida dos partidos. Assim, casos de corrupção e extorsão floresceram sob a cobertura do que na superfície era só financiamento irregular . O que precisa ser dito e que de qualquer forma todo mundo sabe, é que a maior parte do financiamento político é irregular ou ilegal. Os partidos e aqueles que se valem de uma máquina partidária (grande, média ou pequena), ou de jornais, serviços de propaganda, publicidade e atividades associativas […] têm recorrido ou recorrem a recursos adicionais irregulares ou ilegais. Se a maior parte disso for considerada criminosa,pura e simplesmente, então a maior parte do sistema político [democrático] terá de ser considerada criminosa”.

Só que não colou. Ao contrário, o pronunciamento de Craxi foi tomado pelos procuradores e juízes como uma “confissão extrajudicial” das ofensas cometidas .

“Ganhando impulso, a operação “mãos limpas” de fato provocou a crise mais séria da história da República Italiana, e se estendeu rapidamente aos escalões mais altos do sistema político e econômico do país. Em alguns meses, a magistratura abriu naquele quadro de corrupção e ilegalidade política uma fenda sem precedente na história das democracias ocidentais, envolvendo toda a classe política e amplos setores da comunidade empresarial. A investigação chegou aos níveis mais altos da administração pública e afetou a maior parte das áreas da atividade estatal. Implicou mais de 500 ex-congressistas, muitos ex-ministros, cinco ex-primeiros-ministros, milhares de funcionários públicos e administradores do nível local, o exército, o serviço responsável pela investigação de crimes financeiros de uma maneira geral, as principais empresas estatais e até setores do Judiciário”.

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