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Cartilhas fantasmas na Prefeitura: Justiça aceita denúncia e instaura ação de improbidade

22 de junho de 2010 - 00:00

A 5ª Vara Cível rejeitou a defesa preliminar e recebeu a petição inicial de ação civil pública, por improbidade administrativa, promovida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra o chefe de Gabinete, Nelson Virgílio Grancieri, o assessor de imprensa da Prefeitura, Ronaldo Cabral Medeiros e contra a empresa W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda, em virtude de contrato no valor de R$ 88.500,00 para confecção de 150 mil cartilhas institucionais que nunca teriam sido produzidas (foto).  O Chefe de Gabinete ainda tentou interromper a ação, através de agravo junto ao Tribunal de Justiça, mas por decisão unânime o TJ entendeu que a ação deve prosseguir regularmente para a devida apuração do ilícito e responsabilização dos seus responsáveis. Anotou o Tribunal de Justiça, no recurso interposto pelo chefe de Gabinete, que “existe adequação típica entre a conduta descrita na inicial – segundo alega o Ministério Público – o agravante (Nelson Virgílio Grancieri) embora sabendo que as mercadorias não tinham sido entregues vistou a nota fiscal e a incluiu na ordem de pagamento – e o tipo descrito no art. 11, caput e I, da Lei 8429/94”.

De acordo com os termos do processo ajuizado pela Promotoria, o assessor de imprensa da Prefeitura determinou a abertura de processo licitatório para confecção das cartilhas, nas áreas da saúde, educação e promoção social, “sendo que a nota fiscal da empresa teria sido emitida, mas a mercadoria não tinha sido entregue, havendo apenas alguns exemplares para fraudar a fiscalização”.

Primeiramente foi aberto inquérito civil no qual se verificou que, em diligência realizada em 19 de agosto de 2008, junto à Prefeitura Municipal, as cartilhas não haviam sido entregues, mas a nota fiscal da empresa W.A. estava no setor de licitações, para pagamento. Na época, o chefe de Gabinete, Nelson Virgílio Grancieri, afirmou que a mercadoria havia sido entregue apenas parcialmente e que a Prefeitura só efetuaria o pagamento após a entrega total da mercadoria.

Bloqueio de pagamento

Um detalhe chamou a atenção da Promotoria: mesmo sem o carimbo de “conferido e recebido”, na parte superior da nota fiscal havia uma anotação à caneta com as siglas “p.p. 13/08”, suspeitando-se que seria a data para pagamento. Em dezembro de 2008, a juíza Paula Jacqueline Bredarilol de Oliveira já havia concedido liminar determinando à Prefeitura o não pagamento da nota fiscal.

Ao propor a ação de improbidade, o Ministério Público afirmou que os atos praticados são contrários aos “princípios administração pública, da moralidade administrativa e legalidade e interesse público e violaram os deveres da legalidade, honestidade e lealdade à instituição (Município)”. As penas no caso vão desde a perda da função pública, suspensão dos direitos políticos (três a cinco anos) até o pagamento de até 100 vezes o salário que recebiam. Os envolvidos têm prazo de quinze dias para contestação.

Agravo de Instrumento – O chefe de Gabinete da Prefeitura, Nelson Virgílio Grancieri, ainda tentou impedir o prosseguimento da ação, mediante recurso no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, mas a pretensão foi rechaçada pelos desembargadores, por unanimidade, tendo entendido desnecessária a produção das provas pertinentes e que, em tese, “descartar a caracterização de conduta ímproba”.

Clique AQUI para ver o acórdão do Tribunal de Justiça que negou recurso do chefe de Gabinete, Nelson Grancieri

Abaixo a decisão da Justiça ao aceitar a ação civil para apurar crime de improbidade administrativa:

Despacho Proferido
Vistos, O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO propõe a presente ação civil pública de improbidade administrativa contra NÉLSON VIRGÍLIO GRANCIERI, RONALDO CABRAL MEDEIROS e W.A. PRODUÇÕES ARTÍSTICAS E PUBLICIDADES LTDA., todos com qualificações nos autos, alegando em síntese que foi instaurado inquérito civil por representação noticiando que em 14 de agosto de 2008 a empresa W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. teria firmado contrato administrativo de publicidade, no período eleitoral, com o Poder Público Municipal no valor de R$ 88.500,00 para a produção de três cartilhas institucionais, na área da Saúde, Educação e Bem Estar Social, sendo que a nota fiscal da empresa teria sido emitida, mas a mercadoria não tinha sido entregue, havendo apenas alguns exemplares para fraudar a fiscalização. Alega que a Diretoria de Comunicação está vinculada ao Gabinete do Prefeito Municipal e o Diretor de Imprensa, Sr. Ronaldo Cabral Medeiros, solicitou a abertura do procedimento licitatório, inclusive apresentou justificativa para a confecção das 150.000 cartilhas institucionais, que também foi analisado pelo Chefe de Gabinete, Sr. Nélson Virgílio Grancieri. Aduz que a Promotoria de Justiça de Defesa ao Patrimônio Público ao tomar conhecimento dos fatos determinou a abertura do inquérito civil e procedeu a constatação da denúncia, verificando na diligência realizada em 19 de agosto de 2008 junto à Prefeitura Municipal de Marília que a mercadoria não havia sido entregue, mas a nota fiscal da empresa W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. estava no setor de licitações, sem o carimbo de conferido e recebido e que, nessa diligência, extraiu-se cópia junto ao Poder Público Municipal da nota de empenho do procedimento de licitação por pregão presencial, que recebeu o nº 13/08 e da nota fiscal nº 1.005, emitida em 01 de agosto de 2008, relativa a 150.000 cartilhas, no valor total de R$ 88.500,00. Alega que houve notícia da emissão de outra nota fiscal com os mesmo serviços, tendo em vista que a anterior fora cancelada e, dessa forma, a Promotoria de Justiça procedeu a nova constatação, sendo-lhe entregue pelo Poder Público cópia da nota fiscal nº 1.009, emitida em 15/09/2008, relativa a 150.000 cartilhas institucionais, no valor total de R$ 88.500,00, que se encontrava indicada na ordem para pagamento do empenho nº 14.141. Contudo, não foi apresentado naquele dia o material relativo aos serviços prestados. Aduz que conforme declarações prestadas pelo Chefe de Gabinete da Prefeitura Municipal, Sr. Nélson Virgílio Grancieri, que vistou a referida nota fiscal e acumula as funções de responsável pelo expediente da Secretaria Municipal da Fazenda, a mercadoria teria sido entregue apenas parcialmente, mas declarou que não efetuaria o pagamento enquanto não fosse constatada a entrega integral das mercadorias. Alega que em virtude da insistência dos agentes do Poder Público Municipal em receber documentos fiscais que não correspondem com o declarado na nota fiscal, requisitou-se novamente verificação da Delegacia da Receita Tributária, obtendo-se como resposta que: a) o sócio proprietário da empresa W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. declarou, em 25/09/2008, no procedimento administrativo da receita, que a nota fiscal nº 1.005, de 01/08/2008, foi cancelada porque fora remetido apenas 50% do material, que o remanescente fora remetido com a nota fiscal de nº 1.009 e que ainda não havia recebido o seu montante, bem como declarou que as cartilhas teriam sido confeccionadas por uma outra gráfica; b) verificou-se em 10/10/2008, através do Termo de Contagem de Estoque realizado na referida empresa, que não foram encontradas quaisquer mercadorias em face da execução dos serviços gráficos serem terceirizados; c) a empresa regularmente notificada no curso daquele procedimento administrativo da Receita Estadual apresentou a Nota Fiscal nº 750, emitida em 12/09/2008 pela empresa Boa Impressão Materiais Serigráficos Ltda., sediada na Rua Saldanha Marinho, nº 241, Belenzinho, São Paulo, como sendo a empresa fornecedora dos serviços prestados à Prefeitura Municipal de Marília; d) informou-se, também, que na base cadastral da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo a empresa Boa Impressão Materiais Serigráficos Ltda. figura na situação cadastral como cassada desde 31/07/2002. Posteriormente sobreveio nova diligência realizada pela Receita Estadual na capital paulista dando conta de que a empresa terceirizada mencionada pela licitante W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. não existia mais no local. Alega, por fim, que a execução do contrato administrativo e a tentativa de seu pagamento encontram-se eivados de nulidades, pois o Diretor de Comunicação, Sr. Ronaldo Cabral Medeiros, responsável pelo pedido de abertura da licitação para a confecção das cartilhas institucionais tinha a obrigação de verificar a execução contratual e atestou através do carimbo de conferido e recebido de 17/09/2008, aposto na nota fiscal nº 1.009 da empresa W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. o cumprimento do contrato e a entrega das 150.000 cartilhas, fraudando a execução contratual. Assim, o Diretor de Comunicação não poderia atestar a situação de conferência e recebimento da mercadoria que não havia sido entregue, bem como que a empresa W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. não possuía material gráfico para impressão e a empresa Boa Impressão, que emitiu a nota fiscal, está inativa a vários anos e se encontra com a inscrição estadual cassada e, ainda, a Diretoria de Comunicação é ligada diretamente à Chefia de Gabinete, sob a responsabilidade do Sr. Nélson Virgílio Grancieri que vistou a nota fiscal. Pede a procedência da ação para o fim de reconhecer os atos de improbidade administrativa que atentaram contra os princípios da administração pública, da moralidade administrativa e legalidade e interesse público e violaram os deveres de legalidade, honestidade e lealdade à instituição (Município), nos termos do disposto no artigo 11 "caput" e inciso I, da Lei nº 8.429/92; condenar os requeridos, na forma do artigo 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92, às penas de perda da função pública; suspensão dos direitos políticos de 3 (três) a 5 (cinco) anos; pagamento de multa civil de até 100 (cem) vezes o valor da remuneração percebida pelos respectivos funcionários públicos no mês de setembro de 2008; e à pena de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 (três) anos. Com a inicial veio o inquérito civil que se encontra autuado em
apartado (fls. 29). Notificados, os réus apresentaram defesa prévia, exceto o requerido Ronaldo Cabral Medeiros. Alega a requerida W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. em preliminares: a) desrespeito ao princípio do contraditório e ampla defesa, ilegalidade de prova, ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, inépcia da petição inicial; b) ilegitimidade passiva "ad causam"; e c) impossibilidade jurídica do pedido. Ao final, pugna pela improcedência da ação. O requerido Nélson Virgílio Grancieri alega em preliminares: a) ausência de interesse processual do Ministério Público pelo fato de que há anterior Ação Civil Pública sobre os mesmos fatos, não havendo sentido no ajuizamento desta Ação Civil Pública, pois, inclusive, o curso desta ação terá que ser suspenso, sendo evidente a existência de uma questão prejudicial externa, nos termos do artigo 265, inciso IV, do CPC; e b) inocorrência de responsabilidade funcional ante a inexistência de ato de improbidade administrativa. Pede a rejeição da inicial. Certidão da Serventia às fls. 672 da ausência da apresentação da defesa preliminar do requerido Ronaldo Cabral Medeiros. Manifestação do autor às fls. 674/684. É a síntese necessária. Ficam desde já afastadas as preliminares arguidas. Todas as preliminares arguidas pela requerida W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. estão ligadas à alegação de ilicitude da prova produzida por intermédio do inquérito civil. Contudo, de ilicitude, ausência ou nulidade da prova colhida através do inquérito civil não se cogita. O inquérito civil é mera peça de informação, não estando sujeito à observação dos princípios do contraditório e da ampla defesa. A questão foi apreciada, de forma minuciosa, pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça: "A primeira indagação diz respeito à natureza jurídica do inquérito civil público. Segundo a doutrina, trata-se de um procedimento cujo objetivo é colher elementos de informações que dêem suporte ao Ministério Público para propositura de uma ação civil pública ou coletiva. Nele não se decidem controvérsias, não há acusação alguma e, por isso mesmo, não há contraditório ou defesa. Daí ser um mero procedimento e não um processo. O inquérito tem como característica a facultatividade, porque não se constitui um pressuposto processual para que o Ministério Público inicie a ação civil pública, do mesmo modo como ocorre no inquérito policial, em que pode o Ministério Público dispensá-lo para oferecer a denúncia. A utilização do inquérito civil é aconselhável como forma de controle do Ministério Público, evitando, com a investigação prévia, que se dê à demanda civil um cunho individual do representante ministerial que nela atua. Verifica-se, pela natureza jurídica do procedimento em apreciação, que inexiste nulidade nessa específica colheita de provas, que servem, em juízo, como prova indiciária, elemento de convicção por ser uma investigação pública e oficial. Assim, o que se apura no inquérito civil público tem validade e eficácia para o Judiciário, concorrendo para reforçar o entendimento do julgador, quando em confronto com as provas produzidas pela parte contrária" (REsp 476660-MG – Relatora: Ministra Eliana Calmon). Dessa forma, não se conclui em ilicitude, ausência ou nulidade da prova produzida pelo inquérito civil, que tem suas regras embasadas na Lei nº 7.347/85. O inquérito civil é mera preparação da ação; tem natureza inquisitória, não contraditória, e conclui no momento em que o Ministério Público entende haver elementos suficientes para a propositura da ação ou para o arquivamento. Mesmo que assim não fosse, há elementos no inquérito civil comprovando que a ré W.A. Produções Artísticas e Publicidades Ltda. teve acesso aos autos, não havendo falar-se em desrespeito ao contraditório e à ampla defesa. Ademais, a inicial descreve, de maneira satisfatória, os fatos e fundamentos jurídicos do pedido, formula pretensão não excluída em nosso ordenamento jurídico, utilizando-se de via processual que não é exclusiva, mas integra o sistema de proteção ao patrimônio público e princípios constitucionais, sendo promovida a ação por instituição a qual foi atribuída a missão constitucional de zelar por aqueles bens e valores. As preliminares do requerido Nélson Virgílio Grancieri também não se sustentam. A uma porque a existência de anterior Ação Civil Pública em nada impede a propositura de outra ação, ainda que sejam conexas, como no presente caso e, a duas, porque a alegação de eventual inocorrência de responsabilidade funcional e consequente inexistência de ato de improbidade administrativa é matéria que diz respeito ao mérito e como tal será apreciado.
Ante o exposto, recebo a petição inicial e determino a citação dos requeridos para oferecerem contestação, no prazo de quinze dias, sob pena de não o fazendo, presumirem-se verdadeiros os fatos articulados pelo autor (art. 319, do CPC). Expeça-se mandado, inclusive com cópia desta decisão. Intimem-se e ciência ao Autor.

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