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Comissão para Conservação do Atum leva mais verba do que a Saúde

05 de agosto de 2010 - 00:00

 

Você já ouviu falar da Comissão Internacional para a Conservação do Atum e Afins do Atlântico? Provavelmente, não. Até porque, o atum não é exatamente um alimento frequente na mesa do brasileiro. Mas o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está interessadíssimo em preservar o peixe, raro na costa brasileira. Tanto que repassou, em abril, R$ 517.253 dos cofres públicos para a tal comissão.

O dinheiro foi depositado em uma conta no exterior, conforme relatório das transferências do Governo publicado no portal ‘Transparência Brasil’. O valor é superior, por exemplo, aos investimentos do Governo federal (de janeiro a maio deste ano) em saúde, no município de Araçuaí, cidade com um dos menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) em Minas Gerais. Neste período, a cidade recebeu R$ 485.342,55 da União.

 

A presidência da Comissão Internacional para a Conservação do Atum e Afins – que tem 48 países-membros – é presidida por um brasileiro. Ele é especialista em tubarões, e não em atum, mas, pelo segundo mandato, está à frente do grupo. É o professor Fábio Hazin, um dos diretores do Departamento de Aquicultura da Universidade Federal Rural de Pernambuco. 

Em artigo publicado pela própria entidade, Hazin admite que o Brasil não tem participação efetiva na comercialização dos pescados, cuja preservação, a comissão tem por finalidade defender. De acordo com Hazin, por ano, são comercializadas 500 mil toneladas de espécies controladas pela instituição. E o Brasil com isso?

 

“Apesar de o Brasil dispor de 8.500 quilômetros de costa no Oceano Atlântico, porém, a sua participação na captura de atuns e afins no Atlântico é ainda tímida, representando cerca de apenas 8% do montante capturado, ou cerca de 40 mil toneladas. Mais da metade desse total, porém, é de bonito listrado, uma espécie costeira e de baixo valor comercial, de forma que, em termos econômicos, a participação brasileira é menor que 4%”, diz o professor.

 

A comissão reúne-se uma vez por ano para discutir temas como a restrição da cota de pescados destinada aos países. Para tais reuniões, nada de gabinetes sisudos. Os encontros acontecem em hotéis cinco estrelas situados em locais paradisíacos. E, claro, se estende pelos fins de semana. O último foi realizado de 6 de novembro, do ano passado, uma sexta-feira, e 15 do mesmo mês, um domingo, em Porto de Galinhas (PE).

“A reunião teve festas, coquetéis, diversão e pouquíssimo trabalho. Enquanto os delegados curtiam as caipirinhas, o frevo e o forró, o tempo passava”, contou o ambientalista José Palazzo Truda Júnior, um dos participantes do evento.

 

Fábio Hazin contesta. Diz que a instituição está empenhada na preservação das espécies. Informou ainda que o dinheiro destinado à comissão pelo Governo brasileiro é uma contribuição como país- membro. “Ele (Brasil) pagou a sua contribuição (anuidade), como país-membro, da mesma forma que, todos os anos, tem a obrigação de pagar a sua contribuição à ONU, FAO, e diversos outros organismos internacionais aos quais pertence”, justificou.

 

O Ministério da Pesca e Aquicultura não se manifestou. Segundo dados oficiais, a pesca do atum movimenta cerca de US$ 4 bilhões por ano no Oceano Atlântico. A indústria brasileira produz anualmente 117 milhões de latas de atum, o que geraria 10 mil empregos diretos e indiretos.

 


Roteiro de trabalho inclui Paris

 

Paris será o novo destino dos integrantes da Comissão Internacional para a Conservação do Atum e Afins do Atlântico. A reunião acontecerá na França a partir de 17 de novembro deste ano. Na pauta, o velho pedido dos ambientalistas, mas que nunca é atendido: medidas mais efetivas na preservação das espécies, cuja pesca é controlada pela instituição.

A comissão é responsável pelos gastos com a organização dos eventos. Isto inclui a promoção de festas e coquetéis. Cada delegação paga a estada dos participantes. Isto significa que o Governo brasileiro arca com as despesas, passagem e estada dos representantes do país. Neste ano, o ministro da Pesca e Aquicultura, Altemir Gregolin, é aguardado no evento em Paris.

 

A comissão tem por hábito se reunir em lugares turísticos. Antes do encontro em Porto de Galinhas (PE), ano passado, os integrantes da instituição foram a Marrakech, no Marrocos, conhecida popularmente como “Terra de Deus”. Bruxelas também não ficou fora do roteiro. Os membros da comissão também já estiveram no Rio de Janeiro.

 

O ambientalista José Palazzo Truda Júnior diz que o recurso doado pelo Governo federal à Comissão é destinado mais à manutenção do órgão e à organização dos encontros em lugares paradisíacos. “O dinheiro vai para sustentar a burocracia. A Comissão tem comitês, subcomitês, secretariados e vários funcionários”, afirmou.

 

O presidente da Comissão, Fabio Hazin, confirma o destino dos R$ 517.253 repassados pelo Governo federal. “O recurso é utilizado para financiar todo o funcionamento do grupo, que tem sede em Madri (Espanha), e um Secretariado com mais de 30 funcionários, entre agentes administrativos, técnicos e cientistas”, informou.

 


Ambientalistas criticam

 

Especialistas e organizaçõ-es ligadas ao meio ambiente não poupam críticas à atuação da Comissão Internacional de Conservação do Atum e Afins do Atlântico. As queixas se resumem à falta de iniciativa e medidas tímidas adotadas pela instituição. De acordo com o ambientalista José Palazzo Truda Júnior, que participa dos encontros da instituição, falta vontade política. “O interesse da comissão parece que é o de aumentar a captura.
Não existe compromisso com a preservação”. Ele lembrou que o Governo brasileiro liberou a costa do país para que navios estrangeiros possam pescar. “Ainda vão dar subsídios, e a comissão está de conluio”, disparou.

 

A WWF, organização não-governamental que acompanha os encontros da comissão, saiu insatisfeita do último evento, em Porto de Galinhas (PE). Os ambientalistas queriam aumentar as restrições para a pesca do atum-azul, utilizado na elaboração de sushis. 

 

“A comissão também continua ignorando os contínuos apelos para que se criem santuários nos locais-chave de desova do atum-azul, como é o caso das Ilhas Baleares, na Espanha”, disse a WWF, em comunicado divulgado após a reunião de Pernambuco.

 

Até o Principado de Mônaco critica a atuação da comissão. Em comunicado, disse que a instituição não implementou medidas restritivas o suficiente para garantir a sobrevivência do atum-rabilho, também ameaçado pela pesca predatória.
“Todos os anos a Comissão se reúne e adota grande número de medidas de ordenamento da pesca no intuito de assegurar a sustentabilidade dos estoques”, rebateu o presidente da Comissão, Fábio Hazin.

 

Fonte: Hoje em Dia

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