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Ficha limpa: Juiz critica inércia do Congresso Nacional

19 de outubro de 2009 - 00:00

Quase três semanas depois de entregue ao Congresso Nacional, a proposta de iniciativa popular que visa barrar o registro de candidatos condenados, em primeira instância, por crimes graves ou contra a administração pública, ainda não andou na Casa. Até o momento, ainda não há uma definição de quando o Projeto de Lei Complementar (PLC-518-2009), que recebeu 1,3 milhão de assinaturas de eleitores todo o país, entra em pauta. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), responsável pela iniciativa, chamada de campanha Ficha Limpa, já protocolou ofício solicitando ao presidente da Câmara, Michel Temer, medidas para acelerar a tramitação. Para um dos coordenadores da campanha, o juiz eleitoral Márlon Reis, “está faltando boa vontade dos parlamentares” para votar a proposta.

 O projeto de iniciativa popular foi apresentado oficialmente no dia 29 de setembro, data em que as 43 entidades da sociedade civil que compõem o MCCE entregaram a Temer as assinaturas. Para valer na eleição de 2010, a proposta deverá ser votada até junho do ano que vem, prazo final de registro das candidaturas junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
 
Segundo Márlon Reis, que também é presidente da Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe), está faltando boa vontade por parte dos políticos para a apreciação da proposta. Segundo ele, o projeto foi muito bem recebido pelo presidente da Câmara, Michel Temer, que inclusive parabenizou a iniciativa e prometeu dar agilidade na tramitação. “No entanto, quase três semanas depois de entregue, a proposta ainda está parada. Isso é inadmissível, até pela dimensão e força popular do projeto. Estamos aguardando a nomeação do relator para que o projeto seja votado em plenário”, diz.
 
Márlon Reis acredita que vai haver muita pressão política no Congresso e que a redação final do projeto é imprevisível. “O argumento de que a medida é inconstitucional é inválido, pois a própria Constituição determina que uma lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa e a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato”, explica.
 
Parlamentares contrários
 
Parlamentares contrários à medida afirmam que uma decisão em primeira instância é muito prematura para barrar a candidatura de qualquer pessoa, visto que este julgamento cabe apenas a um magistrado, e não a um colegiado. No entanto, para Márlon Reis, o princípio da presunção de inocência, que impede a punição de um acusado antes de esgotadas todas as instâncias de defesa, não pode ser invocado quando se trata de políticos e eleições. “Imagine uma pessoa que tenha sofrido condenação, apenas em primeiro grau, por haver violentado crianças. Ele poderia participar de um concurso público para professor de uma creche? Não há dúvida de que ele seria impedido de participar”, diz.
 
O projeto prevê que as pessoas condenadas em primeira ou única instância ou com denúncia recebida por um tribunal – no caso de políticos com foro privilegiado – em virtude de crimes graves como: racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas, não poderão registrar candidaturas. De acordo com o juiz, se o político conseguir reverter posteriormente o julgado, ou que cumpra toda a pena e ultrapasse o período de inelegibilidade, ele poderá voltar a concorrer.
 
A Mesa Diretora da Câmara explicou que ainda não se conversou, nas reuniões entre os líderes partidários e presidência, sobre a votação do projeto. Porém, na próxima semana é certo que a proposta não será apreciada, pois os temas já foram definidos. Pode ser que nas demais semanas os líderes e a presidência definam quando a matéria entra direto em plenário. Mesmo assim, a aprovação pode enrolar mais do que se imagina, já que, se receber emenda, a proposta vai tramitar nas comissões competentes, o que pode levar muito mais tempo para uma aprovação final na Casa.
Em 2008, o STF se manifestou contrariamente a uma ação protocolada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que pedia que os candidatos condenados em primeira instância fossem impedidos pela Justiça de disputar as eleições. Com a decisão, o STF manteve a validade da lei de inelegibilidade, seguindo a interpretação do TSE de que apenas candidatos condenados em última instância poderão ser impedidos de disputar as eleições. No entanto, para o coordenador da campanha Ficha Limpa, a decisão do STF não prejudica a proposta. “O Supremo julgou com base na legislação vigente na época. Agora, o cenário jurídico novo é diferente”, acredita Reis.
 
Para a promotora de Justiça Maria Lúcia Morais, coordenadora da campanha no Distrito Federal “O que você tem a ver com a corrupção?”, o direito coletivo tem de estar acima do direito individual. Segundo ela, só no Brasil o princípio da inocência está em um patamar “insano”. “Não há nenhum lugar do mundo com essa supremacia sob o direito da população. O direito individual não pode se sobrepor ao direito social. O Supremo Tribunal Federal está formatando o país nesse sentido. Isso tem de mudar”, afirma a promotora.
 
Vale lembrar que para se inscrever em concursos públicos, o candidato deve apresentar as certidões criminais. Se não estiver tudo ok, não há possibilidade de se realizar a prova. Medida semelhante acontece com juízes e promotores. Para tomar posse nestes cargos, já no quadro de funcionário dos órgãos, os postulantes sofrem uma averiguação rigorosa da vida pregressa. “Não podemos definir cidadão de primeira categoria e de segunda categoria. Os candidatos políticos não podem ter tratamento diferenciado do restante da população”, acredita Maria Lúcia.
 
Pressa para votação
 
Na última quinta-feira, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral protocolou ofício solicitando ao presidente da Câmara, Michel Temer, medidas para acelerar a tramitação do projeto de lei da campanha Ficha Limpa. No documento, o movimento pede que seja dado andamento à matéria, que não precisará mais passar pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Cabe ao presidente Michel Temer nomear o relator para que o Plenário possa deliberar sobre o tema. A campanha Ficha Limpa foi iniciada em abril de 2008.

Fonte: Contas Abertas

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