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Observatório da Gestão Pública: Manutenção de Serviços Essenciais?

29 de novembro de 2011 - 15:24

Esta matéria tem por objetivo demonstrar como a falta de planejamento e a prática de ações como a inversão cronológica de pagamentos de forma abusiva por parte da Administração pública pode prejudicar a sociedade e as empresas que vendem seus serviços e produtos para a Prefeitura por meio de licitações.

Como já explicado anteriormente na matéria (Vamos às compras?) as Prefeituras utilizam os recursos arrecadados e os repasses da União e dos Estados para realizar suas compras por meio de licitações, visando assim estimular a competição no intuito de obter-se melhores preços.

Vale ressaltar também que a responsabilidade legal da Administração Pública possui alguma peculiaridade se comparada as responsabilidades legais dos cidadãos. Enquanto nós podemos fazer qualquer coisa no nosso cotidiano (desde que o ato não seja proibido por lei) sem correr o risco de sofrer algum tipo de punição, a administração pública só pode fazer aquilo que está escrito na lei. Essa distinção é importante para levarmos em conta que algumas ações que a Prefeitura tem tomado podem ser classificadas como “irregulares”.

Para tanto, vamos demonstrar dois processos licitatórios e seus respectivos desenvolvimentos durante o ano de 2010.

Ocorreu no dia 31/05/2010 a licitação PE 060/2010, sendo seu edital de Número 0060/2010, na modalidade Pregão Eletrônico, tendo como comprador a Prefeitura Municipal de Marília que objetivava o REGISTRO DE PREÇOS para eventual “aquisição de material de escritório por um prazo de 12 meses. O número de itens dessa licitação é de 260 e variam entre pincéis, pilhas, papel couche, pastas, percevejos, papel, régua, purpurina, lápis de cor, gizão de cera, glitter e tantos outros materiais denominados de “materiais de escritório”.

Algumas empresas participaram dessa licitação, ora competindo no mesmo lote ora em lotes separados, como exemplo temos as empresas:

Das empresas que participaram dos diferentes lotes a PAPELARIA E LIVRARIA COMPASSO DE MARILIA LTDA foi uma das que mais obteve seus preços registrados em decorrência dos preços pregoados. Dentre os itens ganhos, por exemplo:

Até então podemos observar na tabela dos resultados do pregão que os preços negociados condizem com os preços de mercado e que houve em cada lote um número médio de três empresas participantes.

Uma outra licitação que usaremos como exemplo é o Pregão Presencial 066/2010, também tendo como comprador a Prefeitura Municipal de Marília sendo seu edital o de número 0066/2010 – PMMarília, realizado no dia 22/06/10 e tendo como  objetivo o REGISTRO DE PREÇOS para eventual aquisição de papel couchê liso durante o prazo de  12 meses.

Nessa licitação houve apenas dois lotes e a classificação das propostas ficou da seguinte forma:

Nesse caso, temos que os vencedores também praticaram um preço aceitável no mercado e que os dois lotes também tiveram a participação de três empresas em cada.

Entretanto, ao observarmos como se deu o pagamento por parte da Prefeitura para essas empresas temos que foram realizadas inversões na ordem cronológica do pagamento nas duas licitações.

De acordo com os dados apresentados retirados dos Diários Oficiais da Prefeitura de Marília podemos inferir que a nossa administração pública ainda peca e não cumpre de forma correta o artigo 92 da lei de licitações que diz:

“Art. 92. Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados com o Poder Público, sem autorização em Lei, no ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei:

Pena – detenção, de dois a quatro anos, e multa.

Parágrafo único. Incide na mesma pena o contratado que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia, injustamente, das modificações ou prorrogações contratuais.”

De acordo com a matéria de Aubrey Leonelli  (Inversões da ordem cronológica de pagamentos) : “a Administração não contrata com apenas um ente privado, muito menos faz apenas uma licitação por mês, hipoteticamente. Como são várias licitações, vários contratos, e várias datas de pagamento, a Administração deve observar uma ordem cronológica, uma ordem temporal de pagamentos, devendo ser saldados primeiros dos mais antigos para os mais recentes. Esse ponto está expresso na Lei de Licitações e Contratos Administrativos (LCCA), Lei nº 8.666/93, no art. 5º”

Assim, há uma lógica para que os pagamentos sejam feitos e a Prefeitura conta com um orçamento previamente definido para cumprir com suas obrigações, ou seja, existe (ou deveria existir) um planejamento de compras e despesas para que possam ser despendidas ao longo do ano. Porém é previsto em lei que esses pagamentos podem ser invertidos quando se tratarem da manutenção de serviços essenciais, que são esses e somente esses:

Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:
I – tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;
II – assistência médica e hospitalar;
III – distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
IV – funerários;
V – transporte coletivo;
VI – captação e tratamento de esgoto e lixo;
VII – telecomunicações;
VIII – guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;
IX – processamento de dados ligados a serviços essenciais;
X – controle de tráfego aéreo;
XI compensação bancária.

A prática adotada pela Prefeitura demonstrada aqui denuncia uma artimanha que não está prescrita na lei e que acaba por beneficiar algumas empresas em detrimento de outras, uma vez que ao inverter a ordem de pagamentos a Administração altera quem iria receber primeiro pelo serviço ou bem vendido anteriormente a aquele que foi “passado na frente”.

Como já demonstrado a manutenção de serviços essenciais compreende outra esfera de necessidade. Mostra-se como uma justificativa pífia inverter a ordem de pagamento para pagar a compra de PAPEL COUCHE e de MATERIAIS DE ESCRITÒRIO uma vez que a LEI deixa muito claro em quais casos e situações que a sua utilização é legítima. Somente no primeiro semestre de 2010 a Prefeitura Municipal de Marília já havia invertido 251 pagamentos com a mesma justificativa de “manutenção de serviços essenciais”, contudo nem sempre essa justificativa é plausível ou legal. Nesse caso, mais uma vez, quem perde são as empresas que são “deixadas para o final da fila” e a sociedade que sofre com a falta de planejamento no orçamento da cidade e com a falta de transparência uma vez que as reais justificativas não são dadas.

 

Fonte: Observatório da Gestão Pública/Gustavo Munerato Rodrigues

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