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Picolé testa honestidade em Brasília

22 de junho de 2016 - 10:36

O varejo é a forma mais dinâmica de todas as atividades econômicas, mas a venda do “Picolé da Verdade”, na Universidade de Brasília (UnB), coloca na vitrine muito mais do que a modalidade “self-service”. Nada de moça no caixa, etiquetas antifurto, câmeras ou seguranças para impedir que alguém leve o sorvete sem pagar. O interessado só precisa ser honesto ao abrir o freezer, escolher o sabor e depositar o valor da compra – R$ 2 por unidade – na urna ao lado da geladeira. O Picolé da Verdade permite o exercício da ética e da cidadania para quem, naquele momento, deseja apenas… chupar um picolé!

O Picolé da Verdade é um projeto da oficina de Controle Social e Transparência por Demanda, da Faculdade de Administração, Contabilidade, Economia e Gestão de Políticas Públicas (FACE/UnB). A oficina tem como objetivo capacitar a comunidade acadêmica e a sociedade para exercer o controle social da gestão governamental. O projeto, sob a supervisão do professor e doutorando Abimael de Jesus Barros Costa, conta com a parceria da Eppop – Picolés e Sorvetes Artesanais, uma marca criada em Brasília pelos irmãos Lana e Rudi Vieira Martins e que já virou sorvete de grife na cidade. A Associação Contas Abertas também apóia a iniciativa.

Três alunos do sexto semestre de Economia, Thainá Targino Paixão e Gabriel Vaz Hecht, ambos de 21 anos e Daniel Ribeiro dos Santos, 19, fazem o balanço das vendas diariamente. Foram eles que denominaram o doce de “Picolé da Verdade”. A sugestão do nome foi acatada porque faz referência tanto ao picolé da Eppop que é artesanal quanto à ideia de revelar a honestidade dos seus consumidores. “A honestidade é muito importante para o empreendedorismo de um país visto que uma instituição privada tem que confiar nos consumidores”, disse Thainá.

Esquecidinhos

Em época de Lava-Jato, os primeiros resultados podiam ser bem mais animadores. Em duas semanas, o número de “esquecidinhos”, como são chamados aqueles que “esquecem” de pagar o sorvete, não para de crescer: começou bem, com 2% de inadimplência mas, na última sexta-feira, chegou a 34,01% ou seja, 68 dos 199 picolés que se encontravam no freezer naquele dia foram levados sem qualquer pagamento.

Thainá lembra que o comportamento humano é incerto e é possível perceber exatamente isso com o crescimento do número de “inadimplentes”. A percepção inicial é de que as pessoas se sentem mais confortáveis em levar o picolé sem pagar ao ver que, apesar da atitude desonesta, o estoque de picolé é renovado e não existe qualquer punição. Outra possibilidade é se confirmar a expressão “a ocasião faz o ladrão”, que tenta justificar o roubo afirmando que a vítima “facilitou” a ação criminosa.

Para a empresária Lana Martins, a parceira comercial do projeto, esse primeiro resultado trouxe a certeza de que o problema da corrupção é ainda mais grave do que parece porque não existe só na classe política e que há muito a ser feito. O sociólogo Públio Ribeiro diz que é uma questão de cultura e a mudança social mais difícil de se fazer é a cultural. Somente as novas gerações, desde que criadas com novos valores, com exemplos dentro de casa e em novos cenários social, econômico e político poderão mudar essa imagem maldita do país.

Paraná

A experiência não é inédita no Brasil. Começou no início do ano na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), em Cornélio Procópio (PR). Lá, como em Brasília, o objetivo é reforçar a importância de se combater a corrupção, mas virou um teste de confiança nos corredores da universidade. Os resultados, porém, são melhores. Em um mês foram consumidos 2,4 mil sorvetes e a taxa dos “esquecidos” foi de apenas 2% ou seja, 50 picolés não foram pagos, número bem inferior aos números de Brasília, em apenas duas semanas.

A ideia de tentar essa modalidade de venda na universidade de Cornélio Procópio foi do professor e engenheiro André Luis Shiguemoto, que a trouxe da Noruega, onde viveu. “Lá eles deixavam os produtos na rua. Uma pessoa pegava uma fruta numa banca e entrava no comércio para pagar”, disse Shiguemoto. Mais do que um teste de honestidade, o professor quer discutir a corrupção que, segundo ele, nasce de pequenos deslizes. Para ele, deixar de pagar R$ 2 ou desviar R$ 1 milhão, R$ 2 milhões é a mesma coisa, o ato é o mesmo.

Fonte: Contas Abertas

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