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Quando a vida fica mais cara

18 de outubro de 2011 - 08:10

* Editorial o Globo

Marchas contra a corrupção pontuaram o feriado nacional em diversas cidades brasileiras, começando por Brasília. Não são manifestações de massa – fala-se em 20 mil pessoas na capital federal -, mas, de alguma forma, o recado foi dado: o de que o tema começa a incomodar a sociedade.

Por enquanto, há uma desproporção entre causa e efeito. As causas estão lá. No Santuário Nacional de Aparecida, foram apontadas pelo cardeal Raymundo Damasceno, presidente da CNBB: "Não podemos concordar com nenhuma forma de corrupção. A Igreja pede que as denúncias sejam investigadas."

Por que as consequências ainda são pequenas? Vários motivos já foram sugeridos. O primeiro deles é, sem dúvida, o "feel good factor" – o fato de que o país continua crescendo, o desemprego está em níveis ainda suportáveis, os programas assistenciais atenuam a miséria.

Também há a cooptação de entidades que, em outros tempos, poderiam fazer barulho. Nos dois mandatos de Lula, os sindicatos sentiam-se, de alguma forma, parte do jogo político, eram tratados com deferência (o que ainda pode acontecer, mas em menor grau). Nesse quadro, podem surgir a qualquer momento notas desafinadas, o que aumentaria a sensibilidade social para o dinheiro que é desviado da coisa pública.

O custo da corrupção já foi avaliado – e é altíssimo. Há o desvio puro e simples; e as consequências do desvio. Educação e saúde, como se sabe, são dois pontos vulneráveis no novo projeto "Brasil potência"; e são áreas em que a corrupção atua desabridamente. Muitas vezes, o dinheiro que sai de Brasília é desviado no seu porto de destino – as prefeituras. Nessa área municipal, outra árvore frondosa é a das câmaras de vereadores, que, ou não deviam existir, ou pagam salários exorbitantes em relação à economia local.

Aqui se pode identificar a muito citada paciência (ou leniência) do povo brasileiro com os malfeitos. Porque, se a corrupção federal tem formas sutis de dissimulação, o que impede um município pobre de se rebelar contra seus supostos representantes, que usam e abusam das prerrogativas do poder?

Mas a grande mistificação vem do centro do poder. Vivemos um presidencialismo imperial que serve de modelo para tudo. E, nos dois últimos períodos de governo, não houve um caso de desvio de ética para o qual não se encontrasse desculpa ou atenuante. O ex-presidente Lula chegou a dizer, recentemente, que os políticos deviam mostrar um couro duro para passarem incólumes ante uma eventual saraivada de denúncias.

O Brasil tem mostrado indicadores sociais positivos. Milhões de pessoas tiveram acesso a melhores níveis de vida, consequência de um processo que começou com o Plano Real. Mas a corrupção aumenta, sem cessar, o custo do Estado brasileiro, que já é enorme. Para financiar esse Estado, sobem os impostos e demais cobranças. E o que acontece é que o brasileiro, hoje, está pagando mais caro por todas as necessidades do dia a dia. E assim vão-se criando condições para uma consciência social mais aguda. Que grite forte contra o assustador desvio de recursos.

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