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Sem resposta do poder público, manifestações podem voltar com força ano que vem

27 de setembro de 2013 - 12:21

Sem resposta do poder público, as manifestações podem voltar a ter força nas ruas. Para o cientista social Marco Aurélio Nogueira, da Unesp, o próximo ano poderá ser um terreno fértil para os protestos, ainda que não ganhem os mesmo contornos das mobilizações de junho, que, em sua opinião, tiveram como um dos componentes o crescimento das taxas de endividamento e inadimplência dos brasileiros.

— Há três bombinhas prestes a explodir: as eleições, que sempre são momentos politicamente tensos; a outra é a Copa e a terceira é como vai caminhar o julgamento do mensalão, porque muita gente ficou brava com a aceitação dos embargos. Se o sistema não mudar a linguagem e o tratamento, e aí não é mudar de maneira artificial, mas de fato, as mesmas coisas que jogaram as pessoas nas ruas em junho poderão jogar de novo. E acredito que jogarão, mas não daquele jeito — disse Nogueira à imprensa, depois de participar do debate sobre conjuntura no 37° encontro anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), nesta quinta-feira.

Uma das mesas redondas mais disputadas do encontro, o debate sobre conjuntura girou em torno das manifestações de junho, numa tentativa da academia de entender o processo, que, segundo o cientista político Marcos Nobre (Cebrap) deve mudar os brasileiros. Para Nobre, os protestos são uma revolta contra a “blindagem do sistema político” e exige uma reflexão tanto da sociedade como da esfera política.

— Todas as instituições, todos nós temos de nos repensar a partir do que ocorreu em junho — disse o pesquisador.

Para Nogueira, apesar de toda a mobilização, o poder público ficou inerte:

— O que aconteceu de junho pra cá? Nada. Ao menos do ponto de vista dos governos. Houve um esforço, mas só no campo retórico. Por exemplo: que diabo de reforma política se queria para o Brasil? A proposta não deu certo e agora a montanha está parindo um rato com a minirreforma eleitoral. Só por ser mini, já acho que não serve para nada.

Professor titular de Sociologia na Unicamp, Marcelo Ridenti afirmou que há uma espetacularização dos protestos e destacou o perfil dos manifestantes, que querem reconhecimento e realização. Para ele, são jovens escolarizados que vivem o problema da precarização dos serviços públicos principalmente nos centros urbanos.

— Tratou-se do movimento de uma juventude escolarizada que trabalha e tem dúvidas sobre as suas possibilidades de ascensão. Tem um movimento social de gente que quer ascender, que é enorme. Está se gestando uma realidade nova no Brasil, com desejo forte de democratização — disse ele, que completou: — Os movimentos têm uma mensagem: queremos uma melhor gestão para a aplicação do fundo público, não para financiar a Copa do Mundo, mas os interesses públicos.

Para Marco Aurélio Nogueira, há nas manifestações um componente ainda que não consciente da situação financeira, dado o crescente endividamento dos brasileiros:

— Houve um desencontro de expectativas: as pessoas foram convidadas a consumir, se endividaram, muitos não conseguiram pagar ou começaram a refletir que estavam pagando com sacrifício grande e isso não batia com o que estava acontecendo no país. Ao mesmo tempo em que as pessoas consumiam, os governos gastavam rios de dinheiro viabilizando obras, Copa e tudo. O endividamento é um combustível complicado para a vida política e social. O cara endividado que não consegue pagar é uma bomba de efeito retardado.

Nogueira apontou ainda que os protestos mostram uma diluição da esquerda no Brasil. Para ele, a esquerda se encolheu e “se acovardou”:

— As esquerdas vêm se diluindo muito no país, mas estou me referindo a duas coisas: aos partidos de esquerda, aqueles que levantam bandeiras, que estão encolhidos no Brasil há um certo tempo. Nem sequer o PT desfralda tantas bandeiras como fez antes. A marca PT é muito mais a marca do governo do que a do partido. E no que diz respeito à ideologia, à mentalidade de esquerda, há também uma perda por falta de clareza do que vem a ser esquerda; perdeu-se um pouco o eixo organizador do que vem a ser esquerda, especialmente em relação aos jovens. A dicotomia direita x esquerda continua viva, mas está precisando de uma reciclagem.

O debate contou ainda com a participação de Mariana Toledo, uma das representantes do Movimento Passe Livre (MPL). O movimento foi o propulsor dos protestos de junho e Mariana explicou o ativismo do grupo pela melhoria do transporte público. Ela criticou o que chamou de criminalização dos movimentos sociais. (* A repórter viajou a convite da Anpocs)

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