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TCE alerta prefeitos: "não há mais lugar para amadores"

12 de novembro de 2009 - 00:00

A MATRA reproduz a entrevista concedida à revista "Gestor" pelo presidente do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, Edgard Camargo Rodrigues. Ele diz que não há mais lugar para amadores, ao defender que Prefeituras deveriam ter um corpo técnico permanente, sob o risco de não haver tempo de os prefeitos administrarem e fazerem política. Edgard Camargo Rodrigues começou a carreira pública na Assembléia Legislativa de São Paulo, onde entrou por concurso e chegou a assessor da liderança do Governo Franco Montoro. Depois foi secretário-adjunto de Governo nas administrações de Orestes Quércia (1987-1990) e de Luis Antônio Fleury Filho. Foi justamente o governador Fleury que, em 1991, o indicou para conselheiro do TCE.

 Nesses dezoito anos de tribunal de contas, este é o terceiro mandato de Rodriguescomo presidente. Em entrevista exclusiva à Revista Gestor, esse conselheiro, formadoem direito pela Universidade de São Paulo falou sobre questões internas doTribunal, de aspectos da gestão pública e até de política.
 
 
 
 
ENTREVISTA:
 
Revista Gestor – O TCE vive um dilema: por um lado, um volume monstruoso de trabalho e uma demanda crescente pelos serviços da entidade. Por outro, o pequeno número de conselheiros. Como está sendo equacionada essa questão?
Edgard Camargo Rodrigues – Essa é uma pergunta que eu me faço diariamente.Realmente há demanda reprimida, muito trabalho por fazer. Uma das soluções mais evidentes é direcionar de forma mais seletiva o que vai a plenário. Hoje vão a julgamento desde questões de admissão de pessoal nos menores municípios do Brasil até contratos de grande valor e duração, como os do metrô paulista.
 
Gestor – E como seria feita essa triagem?
ECR – Possivelmente isso teria que ser feito com a criação de novos órgãos dentro do tribunal. Órgãos técnicos e administrativos que filtrassem as demandas e remetessem a plenário apenas o que pode estar irregular.
 
Gestor Com a Lei de Responsabilidade Fiscal, os parâmetros de fiscalização e aprovação das contas dos municípios ficaram mais claros. O arcabouço legal brasileiro,que embasa as decisões dos TCEs, é bom? É moderno? Contempla as necessidades do País?
ECR – O arcabouço não só é satisfatório como é extremamente rígido. Depois da LRF, o serviço do administrador público dobrou e o do tribunal, por consequência também. Já a partir da Constituição de 1988, reforçasse as instituições e o reconhecimento efetivo dos tribunais de contas, que antes eram cartoriais e burocráticos.Agora as leis deram fins e meios para a Justiça.
 
Gestor – Como o senhor enxerga a adaptação dos poderes municipais à nova realidadefiscal brasileira. Há mais contas rejeitadas hoje, na comparação com antes da LRF e da Constituição de 1988?
ECR – Classifico essa adaptação como custosa e extremamente favorável. A qualidade da administração pública melhorou demais, de vinte anos para cá. E um dos efeitos mais claros é o aumento do interesse do gestor público. Não há mais espaço para amadorismo. Se o prefeito não sabe administrar, tem que se cercar de quem saiba. Não épossível ignorar a responsabilidade de cumprir a lei. Nesse sentido, o tribunal tem tentado se aproximar dos gestores municipais, descentralizando sua estrutura.Hoje são dezessete sedes próprias em regiões escolhidas por conveniências operacionais e o ideal é que chegue a vinte. Assim, os auditores estão mais próximos das prefeituras e o Tribunal pode oferecer cursos e orientações sem que gestores precisem vir à capital.
 
Gestor – Atualmente, qual a solicitação de serviços mais frequentes que o TCE recebe?
ECR – Além da aprovação das contas do Estado e dos municípios, os atos de ofício são muito frequentes. Entre eles, o de dar pareceres a respeito de contratos que envolvam o poder público. Mas a maior demanda, sem dúvida, é a de exames prévios de editais de concorrências, sob a alegação de direcionamento ou de falha. Essas decisões precisam ser céleres e normalmente têm sido. Em média, levamos uma semana para pedir
correções ou mesmo liberar os editais. Mas o volume é muito grande. O principal problema relacionado a esses exames prévios é que como qualquer pessoa física ou jurídica pode pedi-lo, está aberto o ensejo a abusos de quem quer embaraçar concorrências ou mesmo ganhar tempo. Trata-se de uma demanda incrível e em franco crescimento.
 
Gestor – O que fica de lado? Há demandas não atendidas pelo Tribunal?
ECR – A maior demanda não atendida diz respeito à solução de dúvidas. A sociedade tem necessidade de informações e o TCE não é um órgão de assessoramento. Recebo inúmeras dúvidas por e-mail, diariamente. Infelizmente, não temos estrutura para responder. O ideal seria ampliar o esforço que promovemos com nossa Escola de Contas, que ainda é pequena. E ela tem que fazer parte de um “sistema de assessoramento”, sem que isso parece algum tipo de pré-julgamento.
 
Gestor – Os conselheiros do Tribunal são nomeados pelos governadores. Nesse processo, em que medida a independência da corte fica comprometida?
ECR – Ser nomeado pelo governador não é a mesma coisa que ser escolhido pelo governador. Dos sete conselheiros, quatro são escolhidos pela Assembléia Legislativa, um pelo Ministério Público, um pelo corpo de auditores e apenas um pelo governador, livremente. Essa mistura de origens ajuda no pluralismo da corte, reforçada por princípios constitucionais, como vitaliciedade e inamovibilidade.
 
Gestor Em que medida a atuação do TCE pode ser preventiva, para evitar rejeiçãode contas, bloqueio de transferências de recursos?
ECR – A atividade pedagógica é da própria função do Tribunal. O ideal é que a educação venha antes do julgamento Prevenir antes de julgar. É uma questão até de honestidade. Nesse sentido, anualmente promovemos reuniões distribuídas em nossas regionais, com todos os administradores públicos interessados. Escolhemos temas específicos. Neste ano, por exemplo, os assuntos foram licitações públicas e terceiro
setor. Em anos anteriores foram educação e planejamento. Depois das eleições realizamos encontros preparatórios com os novos prefeitos e vereadores, antes da posse.Junto com a Fundap, implantamos um Programa de Gestão Governamental. Para isso usamos 80 pontos de videoconferência cedidos pelo Estado, que hoje são utilizados pela Rede do Saber. Ao aderirem ao curso, os administradores ficam sob os cuidados de um tutor e recebem aulas semanais, que somam sessenta horas. Nos cursos aprende-se muito sobre, por exemplo, plano plurianual, orçamento e execução orçamentária.
 
Gestor – No ano que vem haverá eleições para governadores. Que tipo de questão o senhor gostaria de ver tratada nas campanhas, no sentido de facilitar o diálogo entre governos e TCEs?
ECR – Existe um recado que eu gostaria de dar a todos os chefes de executivos, seja de que esfera federativa eles forem. A administração pública precisa contar com um corpo técnico estável. Nas cidades e estados em que isso ocorrer haverá tempo para administrar e fazer política direito. Tem prefeito que fica fazendo continha e, quando começa a administrar de fato, está no fim do mandato e ele já tem três contas rejeitadas.
Com relação às eleições, basta os candidatos entenderem que a sociedade está muito mais exigente. Espero que tenha acabado o tempo das promessas vãs. As campanhas devem ater-se antes de tudo à probidade.
 
Gestor – Os trabalhos dos TCs, em geral, têm sido criticados por autoridades, inclusivepelo presidente Lula. A acusação é de que os tribunais atrapalham e paralisam obras.Como o senhor enxerga esse aparente conflito de propósitos?
ECR – Nesses casos há um equívoco evidente. Nem a Constituição nem lei nenhuma dizem que os TCs têm poderes para paralisarem obras. Na verdade, quem paralisa as obras são as comissões de fiscalização e controle, que estão dentro dos Legislativos. No caso do TCU, trata-se de uma comissão mista, com membros do Senado e da Câmara. Os tribunais de contas apontam erros, irregularidades e enviam aos Legislativos,
que podem parar as obras ou não. No meu entendimento, o TCU não atrapalha PAC nenhum. 

Eis a entrevista: http://www.tce.sp.gov.br/press/Entrevista-Gestor-Dr-ECR.pdf

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