Em julho de 2014 (início do ano epidemiológico, por definição técnica), documentos da Secretaria de Saúde de São Paulo e do Ministério da Saúde, além de alertas do controle de zoonoses e do serviço de vigilância epidemiológica da Diretoria Regional de Saúde identificaram um índice de proliferação do agente da dengue muito acima do estabelecido para situações de controle.
Esse fato foi o prenúncio de um surto na cidade de Marília, o que acabou se concretizando. A população foi atingida por uma epidemia devastadora e mortal sem que o poder público tivesse realizado o que estava ao seu alcance para evitá-la ou recrutado outros recursos para preveni-la ou minorá-la.
Devido ao caos instalado e falta de ação do poder público, a OSCIP MATRA tomou a iniciativa de debater a crise, seu impacto junto à população, ao sistema de saúde e o inaceitável número de óbitos. O objetivo foi mobilizar a comunidade e procurar soluções e intervenções conjuntas.
Coordenada pelo médico e membro da entidade, Carlos Rodrigues da Silva Filho, a MATRA promoveu no dia 11 de março de 2015 uma plenária, que contou com um painel de especialistas da Secretaria Municipal de Saúde, Secretaria Estadual de Saúde, núcleos locais de Vigilância Epidemiológica, controle de zoonoses e todos os setores envolvidos na assistência às pessoas doentes, além de lideranças políticas, associações e representantes da sociedade civil.
No geral, os palestrantes informaram que o poder público municipal demorou demais para reagir e organizar o sistema para o enfrentamento da epidemia. Ao fazê-lo tardiamente, contratou empresas com dispensa de licitações. Por isso, não foi possível garantir a lisura dessas licitações, nem que tenham ocorrido pelo menor custo. Em relação ao número de mortes, o poder público municipal sonegou informações fundamentais, como o número efetivo de casos e óbitos.
O consenso entre os palestrantes foi de que o poder público deveria ter realizado um rápido rearranjo de todo o sistema local de saúde para esse enfrentamento, com a instalação de um Gabinete de gestão de crise e a organização de uma adequada assistência às vítimas.
Números e custos da epidemia:
Até maio de 2015, as informações oficiais foram que Marília registrou 14.632 casos da doença. Oito mortes foram confirmadas e mais dez estavam sendo investigadas. A relação oficial foi de um doente para cada 15 habitantes naquele ponto da epidemia.
No ano epidemiológico da dengue 2014-2015, que se iniciou em julho de 2014 e terminou em junho de 2015, no entanto, os números são muito piores. Foram constados 1.495 casos em 2014 e 21.708 em 2015. Uma morte foi confirmada em 2014 e 35 em 2015, sendo que oito ocorrências foram descartadas e duas investigadas.
Porém, se os dados obtidos forem analisados segundo estudos de outros municípios, por inquérito epidemiológico por sorologia (investigação sorológica por retirada de sangue para análise diagnóstica), para cada caso diagnosticado tem-se outros quatro infectados ou que não manifestaram a doença ou que não foram diagnosticados como doentes.
Seguindo esta proporção, pode-se afirmar que cerca de 80.000 pessoas em Marília contraíram a dengue em 2015 e que as mortes foram superiores às admitidas.
Em relação ao gasto com tratamento dos doentes, a média dos custos por meio do SUS e do Sistema Suplementar de saúde (convênios, privados) seria de aproximadamente R$ 20 milhões, segundo estudo feito pela MATRA. Para prevenir a proliferação do mosquito transmissor da doença, a Prefeitura contratou a empresa Agroatta por R$ 4.177.000,00. Portanto, o não investimento na prevenção pode ter gerado um gasto maior de R$ 21.906.000,00, ou seja, 5,24 vezes a mais.
Segundo a análise, conclui-se que o custo financeiro preventivo, comparando-se com o custo do tratamento, seria significantemente menor caso o Chefe do Poder Executivo do município tivesse seguido as orientações, recomendações e alertas das autoridades competentes.