A matéria evidencia a fragilidade da base de dados utilizada pela Dataprev e mostra que os cruzamentos mínimos necessários não estão sendo realizados. É um programa emergencial que prevê gastos de R$ 152,6 bilhões, e já foram pagos R$ 77 bilhões.
Uma moradora do Distrito Federal teve R$ 600 do auxílio emergencial, pago pelo governo federal, depositados em sua conta no mês passado. A notícia seria motivo de comemoração, exceto por uma razão: Railene Santos Reis, 53 anos, em nenhum momento requisitou o benefício. Segundo reportagem, publicada no site do Correio Braziliense, o “coronavoucher” foi depositado no dia 14 de maio e o pagamento foi identificado pelo filho dela, Alixandre Santos Medeiros, 30, servidor do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Alixandre foi ao banco resolver outros assuntos, retirou o extrato da conta da mãe e percebeu o depósito — identificado como valor referente ao auxílio emergencial. O servidor público conta que a mãe é oficialmente registrada como depende dele há anos. Desde 2013, ele declara a genitora como dependente na Declaração do Imposto de Renda, uma das fontes de consulta do Dataprev para verificar se o solicitante atende as regras de concessão do benefício. Alixandre conta que a renda familiar mensal está acima dos critérios definidos pelo governo (até três salários mínimos ou R$ 3.135), o que, por si só, seria suficiente para negar o pagamento se tivesse sido solicitado.
Ao notar o problema, o jovem acessou o site disponibilizado pelo governo para devolver o dinheiro aos cofres públicos. O boleto gerado já foi pago. Os R$ 600 foram devolvidos voluntariamente por Alixandre nesta quinta-feira (21/05). “Coloquei minha mãe como dependente no Imposto de Renda desde 2016/2017. Portanto, estão repassando os auxílios erroneamente. Não pedimos, mas, mesmo que a gente tivesse solicitado, eles deveriam negar, tendo em vista o critério de renda. Quem realmente precisa fica sem acesso”, diz o jovem.
Justificativas
Procurada pela reportagem, a Caixa Econômica Federal informou que a análise do pedido de acesso ao benefício “é feita pela Dataprev, instituição do Governo Federal responsável por verificar se o cidadão cumpre todas as exigências previstas na lei. Uma vez concluída a análise e retornando como “aprovada”, a liberação do recurso é realizada pela Caixa”.
Já a Dataprev, em nota, informou que, com base na “Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD”, não pode “repassar informações de CPFs específicos a terceiros, somente a seus titulares”. No entanto, com base nos relatos enviados pela reportagem, a empresa afirmou que Railene, por não ter feito a solicitação, “certamente está no CadÚnico”, e o repasse do auxílio “foi processado automaticamente”. A Dataprev informa que os repasses automáticos são realizados para quem pertence a dois grupos, sendo o Grupo 2, do beneficiários do Bolsa Família, e o Grupo 3, de membros do CadÚnico sem o Bolsa Família.
CadÚnico
O governo disponibilizou um site para que o cidadão saiba se está no CadÚnico. A reportagem consultou o serviço e Railene, de fato, está inscrita no Cadastro Único do governo federal como chefe de família, mas com cadastro desatualizado desde 2017. De acordo com a Lei 6.135/2007, as informações do Cadastro Único tem validade máxima de dois anos, devendo ser renovadas após esse período, ou o cidadão tem a inscrição inativada. Esse detalhe revela que o governo pode estar utilizando dados antigos e realizando pagamentos mesmo para pessoas que apresentaram elevação em sua situação socioeconômica, e deixando de fora quem ficou mais pobre no período.
A situação é controversa, pois, enquanto existe a possibilidade de pessoas que não precisam ou não têm direito a receber os R$ 600, milhões de brasileiros que alegam atender às regras tiveram acesso ao auxílio emergencial negado.
Pelo menos 20 milhões de brasileiros que solicitaram o coronavoucher aguardam o benefício há semanas, alguns por mais de um mês, para ter o pedido avaliado. Isso, em meio à mais grave pandemia da história recente do país. Quem tiver o benefício negado por informações inconsistentes, desatualizadas ou erradas, deve contestar o resultado da análise no site do programa e atualizar os dados junto ao órgão responsável, como a Receita Federal, no caso de CPF irregular.
Serviço
Para devolver benefício recebido indevidamente:
https://devolucaoauxilioemergencial.cidadania.gov.br/devolucao
Para verificar situação no CadÚnico:
https://meucadunico.cidadania.gov.br/meu_cadunico/busca_nome.php
Fonte: Correio Braziliense
*imagem meramente ilustrativa.