ILUMINAÇÃO PÚBLICA: UM FINANCIAMENTO BANCÁRIO QUESTIONÁVEL

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A Lei Orçamentária Anual de 2019 (LOA), aprovada pelos vereadores neste mês de dezembro, prevê arrecadação de R$ 958 milhões para a Prefeitura de Marília. E dentre os investimentos anunciados está a “remodelação de toda a iluminação pública da cidade”, que deve custar R$ 23,5 milhões aos cofres públicos, sendo que destes – conforme noticiário veiculado na imprensa local – aproximadamente R$ 15 milhões viriam de um FINANCIAMENTO a ser contratado junto ao Banco do Brasil – transação que ainda precisa de aprovação do Legislativo. Até aí, nada demais.

O que chama a atenção é o fato de que, desde à edição da Lei nº 5377/2002, o Município já conta com fonte específica de custeio para os serviços de iluminação pública (CIP). O Parágrafo Único do art. 1º desta lei diz que a contribuição tem a finalidade de custear “o consumo de energia destinada à iluminação de vias, logradouros e demais bens públicos e a instalação, manutenção, melhoramento e expansão da rede de iluminação pública”. Ou seja, os recursos oriundos da CIP têm a finalidade não só de custear a energia consumida para a iluminação pública, mas também subsidiar a instalação, manutenção, melhoramento e expansão da rede (parte em que se inserem os motivos do empréstimo anunciado, como a troca das lâmpadas, por exemplo).

Todavia em resposta ao requerimento nº 1313/2015, formulado pelo combativo vereador Wilson Damasceno e aprovado pela Câmara em 16/10/2015, a Prefeitura informou que com os recursos da CIP eram pagas (pelo até aquela data) as contas de luz de diversos prédios onde funcionam repartições públicas municipais e até estaduais e federais, tais como: o prédio da R. Bahia nº 84; o da Av. das Indústrias, e até despesas havidas, como em condomínios residenciais, Junta de Serviço Militar e de diversos prédios onde se situam serviços públicos municipais. A lista é extensa e suspeita-se que nada tenham a ver com o “custeio dos serviços de iluminação pública” nos moldes do conceito jurídico enunciado nas resoluções da ANEEL, conforme constou de matéria publicada no Jornal da Manhã e no site da própria OSCIP (Matra, CIP: O FUNDO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA E O DESVIO DE FINALIDADE, 7/05/2017).

Embora essa mesma lei acima indicada tenha criado o Fundo Municipal de Iluminação Pública – de natureza contábil a ser administrado pela Secretaria Municipal da Fazenda e capitalizado com os recursos arrecadados da CIP (art. 6º e Par. Único) – o fato é que esse Fundo jamais foi devidamente regulamentado pelo Executivo. E desde março de 2017 a Matra vem cobrando oficialmente a sua regulamentação, mas o máximo que conseguiu foi a criação de uma conta bancária específica para tais depósitos. Antes disso, ao que consta, nem a conta bancária específica havia e sendo assim, a receita arrecadada com a CIP poderia ser facilmente misturada com as receitas gerais do Município. Por dedução lógica, poderia custear quaisquer despesas gerais do Município.

No entanto, a abertura de uma simples conta bancária não atende aos requisitos legais pois é preciso cumprir integralmente a legislação – notadamente a Lei federal nº 4.320/64, na parte que trata dos Fundos Especiais (arts. 71 a 74). Mas não só ela, como também as normas administrativas de Receita Federal, na parte que trata das exigências quanto ao CNPJ (IN RFB nº 1005 de 09/02/2010, I e XII). A existência de um Fundo, devidamente regulamentado, garante que os recursos sejam segregados no orçamento geral do Município, já que uma Contribuição finalística, como o é a CIP, não pode ter seus recursos desviados para outras finalidades sem agredir a CF/88. Essas formalidades são necessárias à transparência da utilização desses recursos e deveriam também ser cobradas pelo Legislativo em sua atividade fiscalizatória.

O que estamos pretendendo esclarecer é que faz exatamente 15 anos que todos os consumidores de energia elétrica residentes ou estabelecidos no território do Município vêm contribuindo financeiramente para o custeio tanto da energia quanto da manutenção, melhoramento e expansão da rede. Mas que parte desses recursos sempre foram desviados de suas finalidades constitucionais e agora estamos na iminência de assistir à contratação de um empréstimo de R$ 15 milhões, para os mesmos fins previstos na lei criadora da CIP.

Não faz sentido! Parece incrível que o Poder Executivo mantenha uma cara estrutura jurídica e na hora de interpretar a lei não faça uso dessa estrutura. Afinal uma das tarefas mais nobres da advocacia pública é justamente a de exercer o controle prévio da legalidade dos atos administrativos. Mas ela precisa ser melhor utilizada e ter a necessária autonomia funcional para exercer as suas funções, exarando pareceres segundo o livre convencimento dos procuradores, sem receio de sofrer retaliações. Caso contrário o Executivo acaba “tomando bola por debaixo das pernas”, como se diz na linguagem esportiva.

Agora a caneta está nas mãos dos 13 vereadores, para aprovar ou rejeitar a proposta do empréstimo e o que se espera façam bom uso das respostas ao requerimento do vereador acima mencionado, visando exercer o seu papel constitucional de comprovar a legalidade eficácia, eficiência da gestão orçamentária, financeira e da aplicação dos recursos públicos (CF/88, art. 74 II). No final espera-se que o debate seja travado com a qualidade que o povo espera dos seus representantes e sem vinculações ideológicas.

A Matra trabalha há doze anos em defesa da transparência e da boa aplicação dos recursos públicos e não se cansa de lembrar que Marília tem dono: VOCÊ! E VOCÊ NÃO MERECE PAGAR UMA CONTA DUAS VEZES.