Uma perversa opção: Administração transfere ao DAEM dinheiro destinado à conservação das vias públicas
Que numa democracia representativa como a nossa, as opções políticas são feitas pelos eleitos para representar a população, isso ninguém discute. O que se pode discutir é se essas opções representam ou não os anseios dessa mesma população. É essa questão que devemos debater.
A Constituição da República consagra o direito fundamental da livre locomoção em todo o território nacional. Não só para isso, mas também por isso é que se constroem, pavimentam e sinalizam as vias públicas. Todavia, as condições de segurança no tráfego dependem muito da forma como são construídas, conservadas e sinalizadas essas vias públicas.
Recorde-se que o estado de conservação das vias foi um dos itens da pauta de reivindicações que levou a população de Marília às ruas por mais de uma vez. As pessoas já não aceitam os riscos de transitar por vias esburacadas, mal sinalizadas e mal iluminadas.
Façamos uma comparação: o relatório da Secretaria de Trânsito e Transportes de Sorocaba (URBES) aponta 46 mortes no triênio 2009/2011, o que significa a média de 15 mortes por ano e um índice matemático de 0,0000238, considerando a população atual de 629 mil habitantes.
Por outro lado, dados exaustivamente veiculados pela imprensa local em 2012 nos dão conta de 53 acidentes com mortes em Marília para uma população de aproximadamente 219 mil habitantes, o que nos leva a um índice matemático de 0,0002420. Se aplicado à realidade populacional de Sorocaba, o número acidentes seria bem superior à média de 15 mortes por ano.
Em suma, é possível concluir que se Marília tivesse obtido índice idêntico de mortes no trânsito ao verificado em Sorocaba, as mortes estariam reduzidas a cinco e não chegaria ao elevado número de 53. Ou seja, pelo menos 48 pessoas poderiam ainda estar vivas na cidade. Mas não estão. E para desespero de seus entes queridos, foram vítimas do que se poderia chamar de “extermínio oculto”. Em grande parte, de responsabilidade do poder público.
Porém, na contramão das evidências, o que fez a Administração Pública, apoiada pela maioria dos vereadores? Solicitou mediante o Projeto de Lei nº 87/2013 autorização para abertura no orçamento vigente de um crédito adicional especial no valor de R$ 830.000,00 para transferi-lo ao DAEM (Departamento de Água e Esgoto de Marília) como “contrapartida” (?) destinada a cobrir despesas referentes às obras de implantação do sistema de afastamento e tratamento de esgoto na cidade.
Acontece que para abrir esse crédito adicional especial, os recursos teriam de sair de algum lugar e a opção foi, exatamente, pela anulação de parte da dotação orçamentária prevista para a conservação das vias públicas. E aí reside o problema: desvestiram um santo para vestir o outro, quando com melhor planejamento poderiam ter deixado a ambos igualmente vestidos.
É que somadas as despesas fixadas no orçamento/2013 para o Gabinete do Prefeito (R$ 7.588.000,00, de onde saem generosas verbas de publicidade) com despesas fixadas para o urbanismo (R$ 46.630.600,00), se verifica que o Poder Executivo mariliense tinha a seu dispor R$ 54.218.600,00, de onde poderia ter tirado os R$ 830.000,00. Mas não o fez, preferindo tirá-los do item conservação das vias públicas.
Se a população mariliense fosse chamada a escolher, certamente teria optado, por exemplo, por menos publicidade de governo e mais segurança nas ruas. Mas pelo visto ela terá que conviver por muito mais tempo com os riscos e demais consequências, frutos, agora, de uma perversa opção política.